“Foi
então que o vento começou a soprar. Compreendi que viver é isto. Uma
canoa que a vida nos empresta e só vale o quanto temos disposição para
remar. Tenho medo que a minha termine num gemido afogado, por ter batido
em uma rocha atormentada por lembranças que ela decidiu petrificar. Mas
preferi acreditar que o temporal passaria largo e ao invés de se
despedaçar eu a encontraria reluzente sobre as águas. Às vezes eu fico
de pé dentro dela, gosto de olhar a travessia. Gosto de forçar o remo e
sentir como é bonita a maneira como ela deixa tudo para trás. Olho para
as margens e vejo o sol mergulhar no horizonte. Vejo as flores, os
bosques, os prados, os jardins, as florestas e seus bichos correndo para
os montes. Quero um mundo com o qual eu possa me emocionar. Quero ter a
soberania de uma borboleta almirante e cessar fogo no entrecortar de
minhas asas. Quero uma paisagem pela qual valha a pena lutar. Chega de
me estraçalhar em guerras para as quais eu nunca tive armas. A alma sabe
quando o corpo tem que parar.” (Lídia Martins)
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